O castigo do sol


“Tudo depende do ponto de vista”. A frase – clichê - tem lá sua razão de existir.
Semana passada estive em Acaraú, região norte do Ceará, e me espantei com o sol. Quem diria que isso um dia iria acontecer. Natural de Fortaleza, cresci com o sol na cabeça a caminho da escola. Mesmo assim, não me acostumei.

Na estradinha carroçal que liga Acaraú a Jijoca, depois de Cruz como quem vai no caminho Ceará-Piauí, revi um sol ameaçador e tirano. Ele não é bem quisto por aquelas bandas nem pela família de carnaúbas que habita por lá. As árvores se contorcem, o chão arde e o gado se esconde nas sombras das árvores pedindo socorro.

No cenário, tristeza. Como será conviver com essa dor ardente todo dis, ficava me perguntando. Enquanto isso, na janela do carro a paisagem não mudava de cor.
O sol de Acaraú e do sertão não é o mesmo sol da minha rua.

Nessa viagem, reencontrei a versão vilã do sol. Aquela que eu conheci aos 6 anos de idade, quando pela primeira vez viajei a Canindé e me espantei com o que ele – o tirano – provoca no sertão.

E ainda teve um dia que o repórter Zé Hamilton Ribeiro me disse abrindo os braços: “Sol é vida, né?”. Quando me lembro disso, faço as pazes com o sol e tento esquecer o cenário da estradinha de Acaraú, com suas carnaúbas, seu chão e o seu gado castigados.

Comentários

Mauro Costa disse…
Muito incisivo, esse seu texto, Belle. Você conseguiu descrever bem o papel do sol na realidade do sertanejo, que varia entre vilão e heroi em matéria de alguns meses, ou em questão de poucos quilômetros.
Ali onde estivemos, ele funciona como motor de uma indústria que se beneficia da beleza do litoral, mas também como carrasco daqueles que vivem a algumas léguas do "açudão".
Engraçado é que a Renata fez uma leitura bem próxima da sua quando passou por esse trecho de estrada, quando disse que a poeira era tanta "que até as carnaúbas e a vegetação restante sentiam isso na pele".
Beijos!
Ai ai que tristeza conheceher o "defeito" do sol. Eu que sou apaixonada por toda aquele amarelidao de uma quintura as vezes cruel como a da estradinha que estiveste.

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